Investimento em Valor #1
A história dos negócios e da análise de investimentos é marcada pelo aparecimento de diversas estratégias e filosofias, com cada uma possuindo um perfil de investidor, seus defensores e “gurus”, no mercado de ações não é diferente: alguns seguem as tendências e o market time, buscando antecipar o mercado e permanecer em um ciclo contínuo de compra e venda, e geralmente utilizando os gráficos dos preços para determinar seus pontos de entrada e saída do mercado. Outros investidores observam os fundamentos das empresas, estudam os índices, procuram as demonstrações contábeis, observam o cenário macroeconômico e projetam fluxos de caixa.
Dentro de cada uma das filosofias, também existem estratégias, e abordar cada uma delas aqui seria no mínimo inviável. Logo, uma vez que a “filosofia” do investimento em valor possui menor divulgação para o investidor individual, acreditamos que seria um ótimo ponto de partida para os leitores do blog, tendo em vista o “momento fundamentalista” no qual estamos focando atualmente.
Essa série será dividida em duas partes, onde a primeira abordará o surgimento e as características do investimento em valor. A segunda parte vai apresentar algumas métricas e estratégias desenvolvidas por investidores e pesquisadores como forma de escolher as melhores ações.
Origem
A origem do investimento em valor pode ser creditada aos professores da Universidade de Columbia, Benjamin Graham e David Dodd, em seus livros Security Analysis e O Investidor Inteligente, e é baseada em três características do mercado financeiro:
Os preços das ações são sujeitos a movimentos muitas vezes imprevisíveis;
O Valor das ações é relativamente estável e pode ser mensurado pelos fundamentos das empresas. Ou seja, o preço é uma coisa, o valor é outra. Eles um dia podem convergir, mas geralmente divergem.
A estratégia de comprar uma ação quando o preço estiver abaixo do real valor tende a gerar retornos superiores em logo prazo. Esse gap entre o preço e o valor seria a famosa Margem de Segurança”. A ideia central é “comprar 1 dólar por 50 centavos”.
Em resumo: comprar barato, segurar e esperar pela convergência entre o preço e o valor, recebendo dividendos ocasionais no processo.
Pondo desta forma parece simples, mas o encontro de tais empresas pode ser complicado uma vez que o mercado tende a se equilibrar e mitigar as oportunidades de investimento. Outra questão está nos fatores macroeconômicos que afetam de forma diferente cada setor da economia.
Dessa forma, o investidor em valor nos moldes clássicos, como definido por Graham, é aquele que busca conhecer as empresas que pretende investir e comprar as ações quando os critérios e indicadores forem atendidos.
Em outra linha, o investidor fundamentalista de curto/médio prazo analisa as projeções futuras e como as variáveis macroeconômicas e as demonstrações das empresas podem afetar o valor. Não necessariamente avaliando apenas empresas “em preço de barganha”, uma vez que inclui empresas de alto crescimento (se fossemos classificar a LMF-UFPB, provavelmente ela cairia aqui atualmente).
Outra classificação interessante é utilizada por pelo Profº Damodaran, o qual parece desacreditar das abordagens mais restritivas de valor por achá-las rígidas e até mesmo “ritualísticas” demais [FONTE]. Ele classifica-os em:
Passive Screeners: Seguindo a tradição de Ben Graham, buscam ações que têm características que acreditam ser de ações de valor, como exemplo: índices P/VPA (Price-to-book) abaixo de 1.5, P/L (Preço/lucro) abaixo de 15, bom histórico de pagamento de dividendos e sem prejuízos registrados.
Contrarian Investors: São investidores que investem em empresas que outros desistem, quer seja porque tenham dado errado no passado, quer seja porque suas perspectivas de futuro são sombrias.
Investidores Ativistas: São investidores que investem em empresas mal dirigidas, mas depois tentar mudar a forma como as empresas são geridas.
Dessa forma, a classificação de “Value Investing” é bastante ampla, porém das características mais marcantes sobressaem-se: investimento de longo prazo (buy n’ hold), busca de vantagem competitiva sólida, busca pelo valor intrínseco da companhia e uma forte tendência para a não especulação. E principalmente: o ideal de estar comprando a empresa por trás da ação, não se preocupando com as flutuações diárias apresentadas.
Ações de Valor (Value Stocks)
Mas como eu acho estas ações?
Como já abordado no tópico sobre as origens do investimento em valor, uma das principais características é a de que as ações de valor são negociadas por um preço menor em relação aos seus fundamentos. Se você procurar pelos critérios clássicos sugeridos por Ben Graham irá encontrar checklists que podem ser adaptadas para seleção, a lista abaixo apresenta os 10 critérios originalmente propostos:
Índice earnings-to-price yield (índice Lucro/Preço) no mínimo duas vezes um título AAA e Dividend yield no mínimo 2/3 de um título AAA (poucos países possuem títulos com rating AAA, veja os ratings da Moody’s aqui);
Índice Preço/Lucro menor que 40% do maior P/L que a empresa reportou nos 5 anos passados;
Preço abaixo de 2/3 do valor contábil por ação (Índice VPA);
Preço abaixo de 2/3 do “Net Current Asset Value por Ação” ((Ativo circulante – Passivo total)/número de ações);
Endividamento menor que o valor contábil;
Liquidez Corrente maior que 2;
Endividamento menor que 200% do Net Current Asset Value;
Crescimento anual dos lucros em um período de 10 anos de pelo menos 7%;
Não mais do que duas quedas nos lucros nos últimos 10 anos. Com um limite de queda de 5% em relação ao ano anterior.
Então é só seguir essa lista que eu fico rico?
Na verdade, dificilmente você irá encontrar no mercado brasileiro alguma empresa que passe em todos os critérios da lista, de forma que, se o investidor resolver seguir essa estratégia deve flexibiliza-la para encontrar alguma empresa.
Essa lista provavelmente vai funcionar melhor nas bolsas dos EUA, devido ao número elevado de ações negociadas, que apesar do declínio desde 1996, ainda é bem maior que o nosso mercado [fonte]:
Mas isso funciona ou não?
Os critérios podem evitar que o investidor compre empresas que apresentaram prejuízo, performance duvidosa, ou caras demais, geralmente selecionando empresas maduras e já estabelecidas no setor. Entretanto, não é certo que as empresas selecionadas irão proporcionar bons resultados, já que o passado não garante o futuro.
Porém, existe um fenômeno observado nos mercados chamado efeito valor, do qual resume-se na existência de retornos anormais apresentados pelas ações com alto índice Book-to-Market (VPA/P). Bem, isso será um assunto para o próximo post
Aproveite para conferir a carteira elaborada pela LMF UFPB clicando aqui.